26 de jun. de 2008

"O destruidor da pintura"

A incredulidade de São Tomé (1602-03, óleo sobre tela, 107x146cm, Potsdam, Château de Sans- Souci)

Poussin não suportava Caravaggio. Dizia que ele viera ao mundo para destruir a pintura. Como arte, entenda-se bem. Mas, graças à sua tempestuosa genialidade, reconhecemos hoje em seus quadros um dos ápices da capacidade humana em retratar o sofrimento, o êxtase cristão, a piedade, a embriaguês, o arrebatamento, a juventude, a sabedoria. O artista usou a luz, a forma e a textura com uma abordagem mais próxima da realidade do homem comum. André Félibien, historiador francês do século XVII, apontou com precisão uma das grandes contribuições de Caravaggio: "Ele representou somente o que aparecia diante dos seus olhos. E fez isso com tão pouco julgamento que nem ressaltava o que era belo nem fugia do que era feio. Em vez disso, ele pintava ambos." Para nossa sorte, de tempos em tempos, a humanidade produz um grande destruidor.


fonte: Caravaggio, de Manuel Jover (Ed. Terrail, 255 pgs, U$ 19,04)

Vento na face

"Meus olhos já tocam o monte ensolarado,
indo muito à frente da estrada que tomei.
Assim somos compreendidos pelo que não podemos compreender;
e que tem sua luz interior, mesmo a distância -

e nos modifica, mesmo que não o alcancemos,
em alguma outra coisa, que sem sentir já somos.
Um gesto nos acena, respondendo ao nosso próprio gesto...
mas o que sentimos é o vento na face."
Rainer Maria Rilke

21 de jun. de 2008

Héracles ferido nas pistas de dança



Hercules and Love Affair é o projeto de disco music (disco is not dead, ok?) do DJ novaiorquino Andy Butler, onde cantam Nomi, Kim Ann Foxman e Antony Hegarty (vocalista de Antony & The Johnsons). Tem ainda convidados ilustres: Tim Goldsworthy do LCD Soundsystem ajudou na produção e Tyler Pope do !!! toca baixo em duas músicas. Eles saíram pelo selo DFA, e bombaram ano passado com o hit ‘Blind’, cantado por Anthony. Em You Belong, outra faixa do grupo, os holofotes vão mais para Nomi, segunda vocalista da banda, enquanto Anthony ‘envelopa’ a música com gemidos e sussurros e o groove rola solto. A música remete aos club hits dos anos 90, com Deee Lite gritando em minhas têmporas. O nome da banda vem da lenda grega de Héracles, herói conhecido por sua força e virilidade, que foram perdidas quando o seu amante morreu. Todos os membros da banda são gays assumidos e bastante respeitados pelos seus trabalhos. É bastante engraçado escutar Anthony, com seu vozeirão mezzo Billy, mezzo Nina, entoar libelos disco numa batida bem animada. Acho muito digno.

4 de jun. de 2008

Muro na berlinda

Eu nem sabia, mas várias frases, repetidas exaustivamente por todos nós, surgiram na Revolução de 1968. Mais precisamente em maio daquele ano em Paris. Momento único no século em questão, estava presente o espírito revolucionário só visto anteriormente na Revolução Francesa. O que se defendia também não era muito diferente. Liberdade. Dois séculos depois, o mundo ainda era assolado por ditaduras lícitas ou ilícitas. A inquietação estava no ar para que a repressão viesse por terra. Em todos os níveis. A agitação gerou inúmeros slogans que seriam mais tarde absorvidos pela própria cultura contra a qual eles gritavam. “É proibido proibir”. “Seja realista, exija o impossível”. “Eu não serei livre enquanto um só homem for servil”. “A imaginação no poder”. Estas e muitas outras mensagens só tiveram o seu alcance graças à grafitagem ou simplesmente à utilização do espaço público para se expressar. Não estou falando de vandalismo. Mas de intervenções mais consciente. Esse espírito contestador ainda está vivo. Veja o uso que o artista plástico britânico Banksy faz desta possibilidade. Tempos diferentes, mas impactos semelhantes.

PS1: se você lê em francês, sugiro um site bastante completo sobre os slogans de 68. Chama-se Slogans et graffiti. Veja também este: Mai 68 – Mai 08. Tem uma extensa galeria de cartazes.
PS2: a revista Esquire fez uma excelente reportagem sobre o artista em novembro de 2005.

2 de jun. de 2008

YSL (*1936 - †2008)

"Não se pode apegar às modas e acreditar demais nelas, ou seja, se deixar levar. É preciso olhar cada moda com humor, superá-las, acreditar o bastante para dar a impressão de que é vivida, mas não muito para poder conservar a liberdade".

montagem sobre foto de André Rau com padronagem inspirada em Mondrian, utilizada pelo estilista em sua criação.